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As bandeiras na janela da Turquia

Estava a ouvir as notícias sobre o sismo em Van, zona por onde tenho uma viagem na minha cabeça que atravessa a Turquia desde o Bósforo e acaba no Irão, e pelo meio o obrigatório directo com uma portuguesa residente em Istambul onde relatava a consternação dos turcos, apesar destes estarem a 1200km do sismo, e que estavam a colocar bandeiras nas janelas.

Não consigo imaginar o que isso seja, não consigo imaginar os turcos colocarem bandeiras nas janelas porque esse já é o estado normal das ruas de Istambul, infelizmente ainda as únicas ruas turcas que conheço, por lá este não é um fenómeno sazonal a cada grande competição futebolística mas sim um sentimento que se vive diariamente.

Ou então estão a forrar a área restante dos vidros e das paredes com as bandeiras que devem ter de reserva no baú em casa.

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Fotografar estranhos


O momento de descontracção antes da oração da hora de almoço.
Mesquita de Beyazit, Istambul

Tenho um problema na fotografia, vários até, mas tenho um em especial que me acompanha desde sempre, desde que me lembro de querer registar o mundo através de uma lente: fotografar estranhos, fotografar a pessoa da rua, o vendedor e o comprador, os realmente estranhos e desinteressados e não fotografar os esperam algo em troca ou têm interesses escondidos. Há algo de medonho em abordar alguém, entrar no seu espaço, por vezes desviando-as do seu caminho, forçando-as a uma pausa. Nunca ter gostei de ser fotografado, provavelmente umas das razões que me levou a passar para o outro lado da lente, a essa mesma razão que me leva a não sentir confortável a fotografar pessoas, e em especial estranhos: o respeito pelo espaço alheio, o medo de invadir o espaço de alguém. Durante muito tempo contornei o problema de encaixar a figura humana no meio urbano (porque não é possível retratar cidades sem pessoas) de várias formas: tornando as anónimas (com silhuetas e imagens arrastadas) ou focando-me mais nos resultados da sua presença do que nelas (procurando grafittis, por exemplo), mas tendo em conta que o foto-jornalismo, a fotografia de viagem ou a fotografia de rua continuam a estar nos meus registos preferidos este é um handicap do tamanho do mundo.

Nos meios fotográficos há duas linhas de pensamento para abordar este tema. Numa delas o fotógrafo é invisível o quanto possível, discreto mas distante, um observador estéril para não contaminar o ambiente que o rodeia  ou um cronista silencioso que regista os movimentos perante a indiferença de quem é retratado. Noutra deverá estar próximo, tão próximo quanto possível, é o fotógrafo que cria uma relação, mesmo que momentânea, com quem é fotografado, onde há uma empatia e uma ligação, o fotógrafo como agente provocador, invisível mas por se integrar com o ambiente e não por ser furtivo. Provavelmente é mais fácil a primeira opção, pegar num “grande canhão” e, tal como um caçador, ir esperar a presa, mas fui sendo levado a seguir o caminho inverso, que por acaso é também o caminho de todos os meus fotógrafos preferidos.

Na foto acima, uma das minha preferidas da última viagem a Istambul, tive de vencer a inércia e ir um pouco mais além, sair da zona de conforto. Era hora de almoço e estava nas imediações da mesquita de Beyazit, ia em direcção a Suleimanye  para depois terminar a tarde em Galata com o Sol a pôr-se sobre o Corno de Ouro. Os espaços abertos nesta cidade não abundam e os que vão aparecendo, como o jardim e o pátio da mesquita de Beyazit, são ponto de paragem obrigatório, em especial em dias onde o Sol decide queimar mais forte. Era então meio-dia, pouco antes da oração, e mesmo não sendo eu um istanbulense em busca de cumprir deveres espiritual fiquei numa pausa mais demorada, há que parar para ver e absorver melhor as coisas, um hábito fotográfico bem útil em viagem. A religião é algo tremendamente social, com todas as cerimónias e rituais colectivos, deixando espaço para socializar (na verdade são das primeiras redes sociais);  aos poucos mais e mais fiéis juntam em grupos antes da oração, não entendo turco mas imagino que se falasse de futebol ou qualquer outra trivialidade. Este movimento humano que ali se concentra é um tema fabuloso e uma oportunidade fotográfica única, a que se junta o pormenor fotográfico de a luz difusa na sombra das arcadas ser bem mais “simpática” que o Sol vertical do meio-dia, mas esta era uma oportunidade efémera, duraria apenas alguns minutos, o tempo até ao início da oração. Não podia perdê-lo, não podia limitar-me a ficar com fotos de um espaço que por acaso com pessoas, era preciso tomar a iniciava.

Como em quase tudo foi bem mais fácil que os filmes que se fazem na cabeça, bastaram os habituais sorrisos, a atenção de partilhar o momento com os modelos improvisados, mais alguns sorrisos, a simpatia faz maravilhas, lá fui à minha vida para Suleimanye e sempre acabei por jantar na ponte de Galata mas com mas algo na bagagem.

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